Tratamento de osteoartrite em cão com a utilização de células-tronco mesenquimais: relato de caso

Por Fernanda da Cruz Landim, Marina Landim e Alvarenga. Omics Biotecnologia Animal. Botucatu, SP, Brasil

A osteoartrite (OA) é uma doença frequente em animais que afeta principalmente os de porte grande, obesos ou idosos, e pode estar relacionada a alterações articulares que comprometem sua estabilidade, como na displasia coxofemoral e ruptura de ligamento cruzado cranial. (6)

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Na OA, o estresse mecânico causa uma sobrecarga na articulação, que leva à liberação de mediadores inflamatórios, ocorrendo uma degeneração da cartilagem articular, que inclui a membrana sinovial, o osso subcondral e os tecidos periarticulares. (1). 

Exame radiográfico do animal Nutella mostrando alterações compatíveis com displasia coxofemoral bilateral, artrose em articulação fêmorotibiopatelar direita (com presença de placa cirurgica) e luxação patelar do lado esquerdo – Foto: Arquivo dos autores

Outro fator que contribui para a progressão da doença é o fato de o tecido cartilaginoso não ser vascularizado. Sendo assim, o processo de reparação tecidual é extremamente lento, fazendo com que o balanço entre injúria e reparação acabe pendendo mais para o lado da injúria. (2)  Assim, a destruição progressiva da cartilagem leva à dor intensa e diminuição da qualidade de vida do animal.

O tratamento depende da causa primária da AO, podendo incluir procedimentos cirúrgicos. Entretanto, geralmente as alterações degenerativas persistem, sendo necessário o tratamento farmacológico, que se baseia em analgésicos, condroprotetores e antiinflamatórios não esteroidais (AINEs). Em muitos casos, é preciso administrar AINEs e analgésicos por longos períodos, levando a efeitos colaterais, como alterações renais, hepáticas e gastrointestinais.

Nutella: cão da raça Kuvaz, de 6 anos de idade, com 58 kg, que foi submetido a uma cirurgia para ruptura de ligamento cruzado cranial no joelho direito – Foto: Arquivo dos autores

Caso do Nutella

Aqui descrevemos o caso da Nutella, um cão da raça Kuvaz, de 6 anos de idade, com 58 kg, que foi submetido a uma cirurgia para ruptura de ligamento cruzado cranial no joelho direito. Cerca de 8 meses depois da cirurgia, o animal voltou a apresentar claudicação. Após o exame radiográfico, foi constatada displasia coxofemoral bilateral, artrose em articulação fêmorotibiopatelar direita (local da intervenção cirúrgica) e luxação patelar do lado esquerdo.

O animal foi tratado com analgésicos e AINEs não apresentando melhora clínica. Foi então instituída a terapia celular com células-tronco mesenquimais (CTMs), sendo realizadas duas aplicações de 20 x 106 CTMs, com intervalo de 30 dias. A dose de células foi distribuída em 4 pontos, sendo realizadas aplicações intra-articulares com 0,5ml da solução contendo as CTMs na articulação coxofemoral bilateral e articulação femorotibiopatelar bilateral. Após 3 dias da primeira aplicação, o animal apresentou diminuição da manqueira e deambulação normal, após uma semana. A medicação analgésica e anti-inflamatória foi gradativamente sendo removida e, com 10 dias de evolução, o animal já corria pelo quintal. Após a segunda aplicação, o animal passou a apresentar comportamentos que não apresentava havia muitos meses, como subir escadas correndo e pular para o porta-malas do carro. O animal continua sendo acompanhado e, após 3 meses do início do tratamento, continua sem sintomas e sem necessidade de nenhuma medicação.

Os resultados obtidos após a aplicação das CTMs estão de acordo com o descrito na literatura (3, 4) e demonstram o efeito anti-inflamatório e analgésico exercido pelas CTMs. Esses efeitos estão associados à liberação de fatores paracrinos, como citocinas, e fatores de crescimento, que agem estimulando a proliferação e diferenciação de condrócitos e a produção de colágeno (4), bem como modulando a proliferação, o recrutamento e a função de linfócitos, células dentriticas, natural killers e células Tregs. (5) Essas propriedades, juntamente à capacidade das CTMs em migrar até os locais de injúria, fazem com que elas sejam eficientes também para o tratamento da dor pós-traumática e anti-inflamatória. (6) A PGE2 e a IDO produzidas pelas CTMs após a exposição ao microambiente inflamatório se ligam aos receptores nos macrófagos e catalisam a degradação do triptofano, promovendo conversão de macrófagos M1 no fenótipo M2 anti-inflamatório, que passam a secretar IL-10 imunossupressora. A PGE2 também está envolvida na modulação do perfil de citocinas de células T CD4+ efetoras, inibindo a produção de IFN-γ e melhorando a conversão de células T CD4+ efetoras em Tregs (7). Os efeitos em longo prazo são diminuição na dor, melhora na movimentação, diminuição parcial e/ou total dos analgésicos, com consequente melhora na qualidade de vida (2).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

1. Rezende M, Hernandez A, Camanho G, Amatuzzi M. Cartilagem Articular e Osteoartrose. Acta Ortopédica Brasileira. 2000;8(2):100-104. doi:10.1590/s1413-78522000000200005

2. Richardson S, Kalamegam G, Pushparaj P et al. Mesenchymal stem cells in regenerative medicine: Focus on articular cartilage and intervertebral disc regeneration. Methods. 2016;99:69-80. doi:10.1016/j.ymeth.2015.09.015

3. Upchurch DA. Administration of adipose-derived stromal vascular fraction and platelet rich plasma in dogs with coxofemoral osteoarthritis, 2015.

4. Zhang B, Wang B, Li S et al. Evaluation of the Curative Effect of Umbilical Cord Mesenchymal Stem Cell Therapy for Knee Arthritis in Dogs Using Imaging Technology. Stem Cells Int. 2018;2018:1-12. doi:10.1155/2018/1983025

5. Shin Tae-Hoon, Kim Hyung-Sik, Choi Soon Won, Kang Kyung-Sun. Mesenchymal Stem Cell Therapy for Inflammatory Skin Diseases: Clinical Potential and Mode of Action Int. J. Mol. Sci. 2017, 18, 244; doi:10.3390/ijms18020244

6. Labusca L, Zugun-Eloae F, Mashayekhi K Stem cells for the treatment of musculoskeletal pain. World J Stem Cells 2015 January 26; 7(1): 96-105

7. Duffy M.M., Pindjakova J., Hanley S.A., McCarthy C., Weidhofer G.A., Sweeney E.M., English K., Shaw G., Murphy J.M., Barry F.P., Mahon B.P., Belton O., Ceredig R., Griffin M.D., Mesenchymal stem cell inhibition of T-helper 17 celldifferentiation is triggered by cell-cell contact and mediated by prostaglandin E2 via the EP4 receptor, Eur. J. Immunol. 41: 2840–2851. 2011. https://doi.org/10. 1002/eji.201141499.

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Fernanda da Cruz Landim

Possui graduação em Medicina Veterinária pela UNESP, mestrado e doutorado em Genética. Atualmente é Diretora Científica da empresa OMICS Biotecnologia Animal Ltda e atua como professora voluntária na FMVZ – UNESP, Botucatu. Apresenta mais de 30 anos de experiência nas áreas de Biotecnologia da Reprodução e Cultivo de Células Tronco.

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