Relação entre estratificação de risco, mortalidade e tempo de internação em três hospitais veterinários do sul de Santa Catarina

Por Anderson Eberhardt Assumpção e Marco Aurélio Eberhardt Assumpção

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar e comparar a relação entre estratificação de risco, mortalidade e tempo de internação em três hospitais veterinários. Este estudo utilizou as informações do banco de dados do programa Vet Control. Para conhecer a evolução dos pacientes classificados por médicos veterinários foi utilizado o Sistema de Triagem de Classificação de Risco de Manchester nos serviços de atendimento, de três Hospitais Veterinários localizados nos municípios de Criciúma (HVC), Tubarão (HVT) e Laguna (HVL) – SC, Brasil. Resultados:o número de pacientes internados, mortalidade e tempo médio de internação analisados foram respectivamente 1425 pacientes internados, 7,4% de óbitos e 2,7 dias para o HVC;1372 pacientes, 15% de óbitos e 3,2 dias para o HVT e 595 pacientes, 13% de óbitos e 3 dias para o HVL. As espécies mais atendidas foram 73% cães e 27% de felinos no HVC, 72% cães e 27% de felinos no HVT e 78% de cães e 22% de felinos no HVL. A classificação de risco mais comum nos atendimentos foi a amarela para todos os três hospitais (53% para HVC), (43% para o HVT) e (52% para o HVL). Morreram 26% dos pacientes do HVC, 28% do HVT e 62% do HVL classificados como vermelho (emergência). Houve relação direta entre a gravidade da classificação do paciente e a mortalidade. Conclusão: o sistema de classificação de risco utilizado pelos médicos veterinários nos três hospitais avaliados foi um bom preditor de óbito para os pacientes internados.

Palavras-chave: cães; gatos; Risco de Manchester; óbitos; internação.

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SUMMARY

The objective of this study was to evaluate and compare the relation between the riskes tratification, mortality and length of stay in three veterinary hospitals. This study used the informationfrom the database of the VetControlprogram. In order to know the  pacients evolution, the Manchester Risk Screeningsistem was used to track the evolution of the classified patients by veterinarians used in the care services of three veterinary hospitals located in the county of Criciuma (HVC), Tubarão (HVT) and Laguna (HVL) – SC, Brazil. Results : The number of Hospitalized patients, mortality and length of stay analyzed were respectively 1425 patients hospitalized, mortality of 7.4%, and 2.7 days for HVC; 1372 patients, mortality of 15% and 3.2 days for the HVT, and 595 patients, mortality of 13%, and 3 days for HVL.

The most attended species were 73% dogs and 27% cats in HVC, 72% dogs and 27% cats ins HVT, and 78% dogs and 22% cats in HVL. The most common risk classification for all the three Hospitals was the yellow one (53% of HVC), (43% of HVT) and (52% for HVL).

About 26% of the HVC patients died, 28% of HVT and 62% of HVL, who were classified as red (emergency). There was a direct relationship between the severity of the patient’s classification and mortality.

Conclusion: the risk classification system used by veterinarian in all three hospitals avaliated was a good death predictor for hospitalized patients.

Keywords: Dogs; Cats; Manchester Risk; Deaths; Hospitalization.

INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA

Atualmente existem escassos trabalhos sobre formas de realizar uma adequada triagem nos atendimentos de urgência e emergência na medicina veterinária. No entanto, a crescente demanda pelos atendimentos que requerem ação imediata associado ao aumento da população de cães e gatos aliados ao cuidado com estes animaistornarão a triagem em estabelecimentos veterinários importantes para salvar a vida dos animais de estimação.

Como consequência deste aumento da demanda por atendimentos, os hospitais e clínicas veterinárias que prestam serviço de qualidade na padronização de risco de morte, terão um fluxograma dos pacientes mais eficiente ao realizar um sistema de triagem. Este modelo é um exemplo dos atendimentos já realizados na medicina em serviços de emergência. Para agilizar o serviço de atendimento e triagem do grande número de pacientes atendidos diariamente, é necessário fazer uso das ferramentas tecnológicas como programas de computador que concentram todas as informações dos pacientes de maneira eficiente e de rápido acesso. Historicamente, o uso da triagem foi utilizado em hospitais militares e passou a ser implementado nos hospitais civis com objetivo de reduzir a mortalidade. Diversos sistemas foram implantados com a utilização de triagem por códigos com números, cores, balões, alfabeto e fitas para indicar a urgência nos atendimentos. A estes sistemas foi relacionado melhor capacidade de tomar decisões em relação a classificação dos pacientes. Os três principais sistemas de triagem de cinco níveis utilizados atualmente foram introduzidos por uma técnica de triagem criada há cerca de 30 anos pelo departamento de emergência do Hospital Ipswich na Austrália. A validação da Ipswich Triage Scale (ITS) permitiu sua adoção como teste de triagem nacional (NTS) e posteriormente como Australian Triage Scale (ATS). Por sua vez, o ATS foi a base do Manchester Triagem Scale na Inglaterra (MTS)e no Canadá o Canadian Triage and AcuityScale (CTAS) (FITZGERALD, 2010).

O Manchester Triage Scale (MTS) é um sistema baseado NTS e utiliza cinco categorias de triagem classificados por cores que indicam tempo de espera e a classificação de risco. O vermelho significa atendimento imediato, laranja muito urgente, amarelo urgente, verde pouco urgente e azul não urgente (RUYS et al. 2012).

O MTS é desenvolvido com a intenção de ser utilizado com auxílio de informática e sem este suporte o sistema de triagem pode ser comprometido. O MTS utilizado na medicina aloca os pacientes em um dos 52 fluxogramas de acordo com a queixa e então o algoritmo determina a prioridade de tratamento com regras fixas que levam em consideração os sinais vitais. É utilizado em países do Reino Unido como Inglaterra e Irlanda, também em Portugal (ESTEVES 2010) e adaptado na Alemanha (CHRIST et al., 2012).

Embora ainda não existam sistemas de triagem validados para medicina veterinária, a maioria dos sistemas de triagem em humanos podem ser aplicados de forma ainda empírica (BRETON, 2012). A introdução de sistemas de triagem padrão na medicina veterinária pode potencializar a acurácia nas consultas. Ainda assim, trará aos veterinários a vantagem de uma classificação de risco que serve como uma terminologia padrão para priorizar pacientes críticos e promover melhor qualidade nos atendimentos (RUYS et al. 2012).

Este trabalho visa determinar a importância de utilizar o sistema de triagem Manchester que foi adaptado junto ao programa de computador utilizado para consultas e internação VetControl na medicina veterinária, e destacar seus benefícios em três hospitais do sul de Santa Catarina.

Este estudo levou em conta todos os pacientes que foram internados do dia primeiro de janeiro a 31 de dezembro do ano de 2022 nos três hospitais avaliados. Os pacientes que não tiveram sua classificação realizada no momento da consulta ou internação foram excluídos do trabalho.

Os hospitais avaliados estão localizados em três municípios no estado de Santa Catarina, nas cidades de Criciúma (HVC), Tubarão (HVT) e Laguna (HVL). A classificação dos pacientes foi realizada exclusivamente por médicos veterinários no momento do atendimento colocando no prontuário do programa Vet Control a cor que corresponde o respectivo risco conforme o Sistema de Triagem Manchester.

O número total de internações bem como número de cães e gatos internados de acordo com a classificação de risco por cores, e a porcentagem correspondente foram distribuídos conforme mostra a figura 1.

Figura 1. Números totais e porcentagem dos pacientes internados por espécie nos três hospitais veterinários conforme a classificação de risco por cores dividida em cinco grupos (ManchesterTriageScale).

O Hospital Veterinário localizado em Criciúma (HVC) obteve ao todo 1490 pacientes internados das espécies canina e felina. No entanto 45 cães e 20 gatos não foram classificados quanto ao risco, sobrando 1425 pacientes. Destes, 73% foram da espécie canina e 27% da espécie felina. A taxa total de mortalidade total ficou em 7,4% (7,2% para caninos e 8,6% para felinos) conforme mostra a tabela 1. O período médio de internação foi de 2,7 dias tanto para cães como para gatos. O HVC obteve ao longo de um ano 1043 pacientes da espécie canina internados, dos quais apenas 75 foram à óbito e 968 pacientes tiveram alta médica totalizando 93% dos pacientes recuperados. A espécie felina teve 382 internações com 33 óbitos e obteve 91% de altas com 349 animais.

Tabela 1. Distribuição do número total e porcentagem de óbitos por espécie no HVC no período de janeiro a dezembro de 2022.
Tabela 2. Distribuição do número total e porcentagem de óbitos por espécie no HVT no período de janeiro a dezembro de 2022.
Tabela 3. Distribuição do número total e porcentagem de óbitos por espécie no HVL no período de janeiro a dezembro de 2022.

No Hospital Veterinário em Tubarão (HVT) o número total foi de 1372 pacientes internados, dos quais 72% (986) foram da espécie canina, 27% (374) da espécie felina. Os animais exóticos somaram 1% dos atendimentos e foram excluídos do estudo. A taxa total de mortalidade total ficou em 15% conforme mostra a tabela 2. O período médio de internação foi de 3,2 dias. Entre os 986 pacientes da espécie canina internados, a mortalidade foi de 14% (142 óbitos) e 844 pacientes com alta médica totalizando 86% dos pacientes recuperados.
A espécie felina teve 374 internações com uma taxa de 16% de óbitos (60 animais) e obteve 84% de altas com 314 animais.

Em Laguna, o HVL realizou 595 internações ao total, destas 78% foram da espécie canina e 22% da espécie felina. A taxa de mortalidade total foi de 13% conforme mostra a tabela 3. A média de internação foi de três dias. Ao todo, dos 595 animais internados, 462 eram cães e 133 gatos.As taxas de mortalidade e altas foram respectivamente de 13% e 87% para ambas as espécies com 61 mortes e 411 altas para os cães e 18 óbitos com 118 altas para os felinos.

A proporção de internação entre as espécies canina e felina foram semelhantes entre os três hospitais avaliados na região sul de Santa Catarina. As internações de pacientes caninos variaram de 72% a 78% enquanto as de felinos ficaram entre 22% a 27%

A classificação de risco mais comum foi a amarela (urgente) para todos os três hospitais avaliados (53% para HVC), (43% para o HVT) e (52% para o HVL).  A porcentagem dos pacientes mais críticos classificados como vermelho (emergência) e laranja (muita urgência) que foram à óbito totalizou 22% para o HVC, 30% no HVT e 67% no HVL. A maior porcentagem de óbitos pelo HVL pode ser explicada pelo baixo número de animais atendidos classificados pelas cores vermelha (emergência) e laranja (muita urgência).

A classificação por cores junto ao prontuário digital disposto no setor de internação dos hospitais também ajuda a salientar os cuidados e atenção para àqueles pacientes internadosque necessitam de cuidados mais intensivos e que estão mais gravemente acometidos.

O alto número de animais atendidos classificados como muita urgência e emergência denota a necessidade da implantação de salas preparadas para atendimentos de ação imediata como paradas cardiorrespiratória e unidades de terapia intensiva para manter cuidados de forma intensiva.

O estudo mostra que houve relação direta entre a classificação de risco por cores e a gravidade do paciente atendido com a porcentagem de mortalidade mais alta para os animais que receberam as cores vermelha e laranja. O sistema de classificação de risco utilizado pelos médicos veterinários nos três hospitais avaliados foi um bom preditor de óbito para os pacientes internados.

AGRADECIMENTOS

Aos médicos veterinários Samuel da Rosa Machado, Vinícius Wischneski e Douglas Rodrigues Vicentin por tornarem possível este trabalho.

Referências

BRETON, Amy N. Triage and initial assessment of the Emergency patient. In: NORKUS, Christopher L. Veterinary technician’s manual for Small animal Emergency and criticalcare. Oxford: Wiley-Blackwell, 2012.

CHRIST, Michael et al. ModernTriage in the Emergency Department. Deutsches ArzteblattInternational, Cologne, v. 107, n. 50, p. 892-898, 2010.

ESTEVES, Ana Luísa Roque de Andrade. Implementação de um sistema de triagem no hospital veterinário escola da faculdade de medicina veterinária. 2010, 66f. Dissertação (Mestrado Integrado em Medicina Veterinária) – Faculdade de Medicina Veterinária. Universidade de Lisboa. Lisboa, 2010.

FITZGERALD, Gerard et al. Emergency departmenttriagerevisited. Emergency Medicine Journal, London, v. 27, n. 2, p. 86-92, 2010.

RUYS, Laura J. et al. Evaluation of a Veterinary triage list modified from a humanfive-point triage system in 485 dogs and cats. Journal of Veterinary Emergency and Critical Care. San Antonio, v. 22, n. 3, p. 303-312.

Prof.(o) Me. Anderson Eberhardt Assumpção

Graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Residência em Clínica e Cirurgia de Pequenos Animais pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA); Residência em Cirurgia e Anestesiologia pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA); Mestrado em Ciências da Saúde pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL); Professor do curso de Medicina Veterinária da Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul desde 2013 até 2022 - Campus Universitário Tubarão www.unisul.br; Professor do curso de pós-graduação em Anestesiologia do IBMVET.

Marco Aurélio Eberhardt Assumpção

Desenvolvedor do Programa Vet Control Programador da Empresa Pet i9. Sócio da Empresa Easy Vet Serviços Veterinários.

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