Mantendo a cuca legal!

Por Marcel E.R. Oliveira

Mantendo a cuca legal!

Cuidados com a Síndrome de Burnout ou Síndrome de Esgotamento Profissional

Antropologicamente percebe-se que o trabalho faz parte da natureza humana e, por meio dele, o homem constrói o mundo e se constrói, com identidade e subjetividade próprias. A execução do trabalho pode ser percebida como primariamente prazerosa, no entanto, em muitas circunstâncias, ainda é sentida como sacrifício e desencadeadora de sofrimento e adoecimento; não pelo trabalho em si, mas pelo clima organizacional e emocional existente no ambiente laboral. E neste sentido pode causar problemas que vão desde insatisfação até exaustão.

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As mudanças que têm ocorrido no mundo do trabalho, como o processo de globalização da economia, as novas tecnologias, a grande competição no mercado de trabalho, a necessidade de se produzir mais e mais rápido evitando desperdícios, acabam gerando um desgaste físico e emocional nos trabalhadores e nessa nova configuração organizacional, são requeridas novas exigências de qualificação e de competências do trabalhador. Adicionamos ainda o acúmulo de tarefas e as cobranças excessivas com pressão e do ritmo de trabalho acelerado por resultados. Acrescente ainda a crise desencadeada pela Covid-19 com a necessidade da proliferação do trabalho remoto (home office) sem a devida preparação e treinamento, tornando um dos únicos locais de descompressão das pessoas (seus lares) numa extensão do trabalho e, em muitas vezes, sem limite ou respeito ao individuo e seus familiares. Como resultado, novas enfermidades surgem em decorrência dessas mudanças. Os agravos mentais ocupam lugar de destaque. Dentre eles a Síndrome de Burnout.

No meio veterinário, essa síndrome exige ainda maior atenção visto que em um estudo conduzido pelos Centers for Disease Control and Prevention (CDC, Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos), observou-se que aproximadamente 1 em cada 3 médicos-veterinários sofre de ansiedade e 1 em cada 6 já pensou em suicídio, resultando numa taxa de mortalidade pelo menos 3 vezes maior que na população em geral. Embora estes dados demonstrem que há possibilidade de problemas de saúde mental nesta profissão, infelizmente a maioria dos médicos-veterinários não procura ajuda por acreditarem que serão estigmatizados e que sua carreira será prejudicada.

De olho nos sintomas

Se você vem sentindo baixa estima, certo esgotamento emocional, com diminuição e perda de recursos emocionais, ou constantemente  está com  tendências a avaliar o próprio trabalho de forma negativa, ou está  frequentemente irritado e com baixa tolerância, sofre de  mudanças bruscas de humor, está com dificuldade de concentração e tem lapsos de memória, dores de cabeça, problemas com o sono e até úlceras digestivas…cuidado isto pode ser um alerta para a chamada Síndrome de Burnout. Esta síndrome é uma consequência do estresse profissional, e se caracteriza por exaustão emocional, redução da eficácia profissional, avaliação negativa de si mesmo, depressão e insensibilidade com relação a quase tudo e todos e pode ocorrer até como defesa emocional. Ela representa um quadro do limite emocional de uma sensação que reprimimos do conhecido jargão organizacional e social do “não aguento mais”.

O termo Burnout é uma composição de burn = queima e out = exterior, sugerindo assim que a pessoa com esse tipo de estresse consome-se física e emocionalmente, passando a apresentar um comportamento agressivo e irritadiço. A expressão burnout em inglês, entretanto, significa aquilo que deixou de funcionar por completa falta de energia, por ter sua energia esgotada.

Como síndrome, o Burnout é o resultado da combinação entre as características individuais de uma pessoa com as condições do ambiente ou do trabalho, o qual geraria excessivos e prolongados momentos de estresse no trabalho. Também definida como uma reação à tensão emocional crônica gerada a partir do contato direto, excessivo e estressante com o trabalho, essa doença faz com que a pessoa perca a maior parte do interesse em sua relação com o trabalho.

Fatores associados

Entre os fatores aparentemente associados ao desenvolvimento da Síndrome de Burnout está a baixa autonomia no desempenho profissional, problemas de relacionamento com as chefias, problemas de relacionamento com colegas ou clientes, conflito entre trabalho e família, sentimento de falta de cooperação da equipe.

Nota-se ainda o Burnout envolve atitudes e condutas negativas com relação aos usuários, clientes, organização e trabalho, enquanto o estresse apareceria mais como um esgotamento pessoal com interferência na vida do individuo e não necessariamente na sua relação com o trabalho. Uma pessoa afetada pela Síndrome de Burnout tem sua vida profissional e pessoal prejudicada.

No Brasil, a Síndrome de Burnout está classificada junto aos Transtornos Mentais e do Comportamento Relacionados com o Trabalho e aparece como sinônimo de Síndrome de Esgotamento Profissional.

O Burnout ainda pode acarretar alterações de longo prazo no corpo, afetando sua imunidade e tornando-a vulnerável a doenças virais, resfriados e outras patologias.

Consequências da síndrome

Mas como o Burnout acaba sendo potencializado nas organizações? Ao entendermos os fatores relacionados, há maior chance de promovermos ações de contenção evitando assim a proliferação desta síndrome para toda a empresa.

Pelo que se nota no cotidiano das organizações a Síndrome de Burnout está basicamente relacionada a um ambiente de trabalho tóxico pela contínua existência de algumas rotinas, tais como: Excesso e jornadas irregulares de trabalho – ou seja aquelas em que não há período definido, incluindo as necessárias pausas para refeições e descanso, altos níveis de exigência de produtividade; metas impossíveis impostas pelo empregador, constante assédio moral ou desestimulador na condução das tarefas diárias causada pela inabilidade ou despreparo de gestores na condução e motivação de suas equipes e insegurança em relação ao emprego.

Para as organizações esta síndrome pode contribuir na queda de produção e afetar os lucros da empresa, pois os custos tendem a aumentar devido ao absenteísmo, baixas médicas e/ou substituição temporária dos colaboradores, baixa produtividade, problemas de qualidade, mal atendimento aos clientes e suas demandas; e assim como podem gerar a evasão de talentos, dificuldades nos novos processos de recrutamento e seleção devido a imagem que a empresa passa para a comunidade. Não fosse só isso, há risco de ações trabalhistas e previdenciárias que também podem determinar o dever de indenizar pelo empregador, seja por dano moral e/ou material, assim como ações regressivas promovidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Prevenção

Às empresas, portanto, cabe investir na capacitação profissional dos trabalhadores e na gestão das principais lideranças, primar pelas boas práticas que visem o bem-estar e o bom relacionamento entre seus colaboradores, adotar políticas e treinamentos periódicos de combate ao assédio moral e qualquer forma de discriminação no ambiente laboral, evitar a prática de jornada extraordinária, observar o período legal de intervalo para alimentação e descanso, adotar o teletrabalho e/ou jornadas de trabalho flexível de forma adequada e sustentável, assim como evitar a cobrança de metas (se houver) abusivas que respeitem a proporcionalidade e razoabilidade de se atingir. Além disso, fazer cumprir às normas de medicina e segurança do trabalho e adotar práticas efetivas que visem evitar a ocorrência de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais.

Como agir?

O primeiro passo é entender que a Síndrome de Burnout existe e não é uma moda passageira, bem como ter ferramentas adequadas para perceber sua existência. Neste sentido há diferentes formas de ajudar as organizações a evitarem que a síndrome afete sua equipe através de dicas como:

1. Constantes avaliações do ambiente de trabalho e contribuições dos gestores para a criação e manutenção de um clima positivo e focado na criatividade.

2. Constante processo de comunicação interna do CEO e Liderança mantendo canais abertos para o diálogo por meio de informações sobre a empresa e seus negócios, criando assim um sentimento de pertencimento e valorização da empresa.

3. Constante reconhecimento dos colaboradores por meio de programas e abertura para iniciativas de sugestões em inovação e produtividade.

4. Constante envolvimento da família e comunidade no cotidiano da organização oferecendo a aproximação por meio de visitas a empresa ou ações participativas dos colaboradores e familiares.

5. Constante monitoramento da saúde física e mental de seus colaboradores por meio de programas e orientação preventiva e ostensiva quanto à saúde e o bem-estar dos seus colaboradores e familiares. Prevenir e melhor e mais barato do que tratar.

Faça a sua parte

O combate ao Burnout não é de exclusividade das organizações. Esta é uma atividade de mão dupla onde o colaborador também precisa fazer sua parte. A seguir elencamos algumas atividades que precisam ser realizadas com disciplina e responsabilidade, tais como: atividade física regular; exercícios de relaxamento; adoção de uma alimentação saudável; maior contato com amigos e familiares; respeito às diferenças e limitações do outro; respeito para os horários de trabalho x laser x família; conheça e respeite os sinais de seu corpo e mente; evite a automedicação; priorize o planejamento e organização de seu trabalho; faça pequenas pausas e exercícios durante sua jornada de atividades profissionais ou pessoais e procure ajuda de profissionais médicos & terapeutas caso necessite. Atualmente a Síndrome do  Burnout é considerada um sério processo de deterioração da qualidade de vida do trabalhador, tendo em vista suas graves implicações para a saúde física e mental.

Faça sua parte, enquanto empresário ou colaborador…afinal é seu dever manter uma Cuca Legal! Ganham a empresa, o funcionário, a família, a comunidade, os clientes e a sociedade.

Marcel E.R. Oliveira

Mestre em Administração de empresas atuou em importantes empresas multinacionais e líderes em seus segmentos como IBM, Bosch, Ford, Schaeffler e ZF. Atuou em áreas distintas como planejamento e produção, automação industrial, vendas, marketing, relações corporativas, segurança da informação e recursos humanos. Ocupou nos últimos 20 anos de sua carreira a posição de Vice-Presidente de Recursos Humanos, Comunicações e Relações Corporativas. Email: [email protected] www.linkedin.com/in/marceleroliveira

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