Megaesôfago em felino de 17 anos: relato de caso

Por 1Priscila Barreto de ABREU, 2Giovanna Funiscello de SOUSA, 3Isabelly Berbat UTSONOMIA, 4 Jennifer Novaes SOARES, 5Mariana Lourenço VELONI

Megaesôfago em felino de 17 anos: relato de caso

MEGAESOPHAGUS IN 17-YEAR-OLD FELINE: CASE REPORT {PAYWALL_INICIO}

RESUMO

Megaesôfago é caracterizado pela dilatação total esofágica, causada pela perda da função motora do esôfago, podendo ser encontrada na forma congênita ou adquirida. É uma enfermidade rara em felinos, principalmente em animais adultos. O principal sinal clínico é a regurgitação devido a hipomotilidade e irritação da parede do esôfago. O diagnóstico é feito com base na anamnese e nos achados radiográficos. No Centro Veterinário Eiras Garcia foi atendido um paciente errante felino, macho, de 17 anos, sob a queixa de prostração e êmese após alimentação. Foi diagnosticado com megaesôfago e submetido ao tratamento paliativo, com alterações de manejo e medicações.

Palavras-chaves: Megaesôfago. Felinos. Manejo.

ABSTRACT

Megaesophagus is characterized by total esophageal dilation, caused by loss of esophageal motor function, which can be found in congenital or acquired form. It is a rare disease in felines, especially in adult animals. The main clinical sign is regurgitation due to hypomotility and irritation of the esophageal wall. The diagnosis is made based on anamnesis and radiographic findings. At the Veterinary Center Eiras Garcia, a 17-year-old male stray feline patient was treated, due to emesis after feeding and prostration. It was diagnosed with megaesophagus, and underwent palliative treatment, with changes in management and medications.

Keywords: Megaesophagus. Cats. Management.

INTRODUÇÃO

O esôfago é um órgão largo e dilatável portanto entende-se como megaesôfago a dilatação esofágica em sua totalidade e que possui como causas a origem congênita, adquirida ou idiopática, sendo essa última considerada a mais comum, resultando em um esôfago aperistáltico (1).

O megaesôfago é considerado raro quando achado na espécie felina, acometendo cerca de 0,05% dos gatos (2). Pode ocorrer de forma secundária e adquirida, como nos casos de estarem associados a corpos estranhos esofágicos ou anomalias do anel vascular, gerando o quadro de megaesôfago. A causa congênita ainda é desconhecida e o megaesôfago secundário é consequente de qualquer condição que acarrete no rompimento do reflexo nervoso ou que afete o funcionamento do músculo esofágico (3,4).

Como sinais clínicos, pode-se observar anorexia, tosse, disfagia, dispneia, perda de peso acentuada, fraqueza, regurgitação pós prandial, retardo do crescimento, desidratação, inapetência, engasgos ou ainda gerar um quadro de pneumonia por aspiração secundária (3). O diagnóstico presuntivo é caracterizado pelo quadro clínico apresentado e exames de imagem. O exame de eleição é o esofagograma, exame no qual se observa a dilatação do esôfago em todo o seu trajeto através da administração de contraste bário (3 mg/kg) (1).

O tratamento clínico é sintomático e é dado por medidas de suporte. O exame radiográfico não distingue a PAAD (persistência do arco aórtico direito) de outras anomalias do anel vascular (1). A mudança no manejo do paciente é realizada através da alteração no manejo alimentar, no qual o paciente deve ser alimentado em posição elevada e de 45o, e preferencialmente ser alimentado com comidas pastosas. Também deve-se manter o animal em postura bipedal durante a alimentação e posteriormente mantê-lo por cerca de 15 minutos após ingerir os alimentos para facilitar, com auxílio da gravidade no trajeto do alimento no trato esofágico do animal (1,3).

O megaesôfago em felinos tem como cunho benéfico, melhor prognóstico em detrimento ao encontrado na espécie canina (2).

RELATO DE CASO

Foi atendido no Centro Veterinário Eiras Garcia, um felino de nome Trovão, sem raça definida, macho, 17 anos, pesando 3,500kg. Animal errante foi atendido sob a queixa de êmese, diarreia líquida sem presença de sangue e hiporexia. Ao exame físico, o animal apresentava-se desidratado, temperatura corporal de 39oC, prostrado, presença de abdominoalgia, mucosas hipocoradas e presença de secreção nasal purulenta. Foram solicitados exames complementares como sorologia de FIV/FelV, hemograma, exames bioquímicos, ultrassom abdominal e exame radiográfico torácico simples, nos quais foram observados FIV e FelV positivos e em radiografia, acentuada dilatação esofágica em todo seu trajeto, preenchido com conteúdo de radiopacidade ar com deslocamento ventral do trajeto traqueal.

Após o diagnóstico de megaesôfago, o tratamento paliativo prescrito ao paciente foi o uso das medicações como: Omeprazol, Ondansetrona, Glicopet felinos e Amoxicilina + Clavulanato de Potássio. Além disso, o proprietário foi orientado a fazer alterações no manejo do animal, administrando uma dieta pastosa e oferecendo a alimentação em um nível mais elevado (na altura dos olhos) para auxiliar a passagem do alimento no trajeto do esofágico.

Figuras 1 e 2 Radiografias latero-lateral direita e ventro dorsal respectivamente, demonstrando dilatação esofágica em felino, macho, 17 anos, sem raça definida

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O paciente do caso relatado realizou inicialmente uma sorologia de FIV e FelV, no qual os resultados foram positivos para ambas as doenças. Sendo essas importantes infecções virais que afetam os felinos, transmitidas pelo contato com secreções de animais infectados ou até mesmo de forma vertical através da placenta ou amamentação, essas enfermidades ocasionam uma baixa de imunidade no indivíduo tornando-o mais susceptível a outras doenças (5,6).

Nos exames de sangue foram analisados o eritrograma, leucograma, plaquetas, função renal e função hepática do paciente. Não houveram alterações dignas de nota nos resultados, encontrando-se todos dentro dos valores de referência (Tabela1).

No ultrassom abdominal todas as estruturas observadas se encontravam com dimensões, contornos, parênquima e ecogenicidade normais.

Foi realizado também uma radiografia de tórax, esta que forneceu o diagnóstico definitivo do paciente. Neste exame as seguintes alterações foram observadas: acentuada dilatação do trajeto esofágico em toda sua extensão, preenchida por conteúdo de radiopacidade ar; deslocamento ventral da traqueia; constrição da carina e brônquios principais; e cavidade gástrica preenchida por conteúdo gasoso.

Por meio do exame radiográfico e dos sinais clínicos apresentados foi possível fornecer ao paciente o diagnóstico de megaêsofago. Não é possível definir a causa dessa alteração devido ao passado errante do animal, mas considerando sua idade é mais provável que seja um megaesôfago de forma adquirida, e não congênita. Foi discutido uma possível associação com a sorologia positiva de FIV e FelV, mas nenhum dado de literatura foi encontrado. A principal suspeita é em relação a ocorrência de esofagite (7,8). A prevalência de megaesôfago é maior em animais com doença esofágica. Foi questionada ainda a provável deficiência de cobalamina, considerando a dieta incompleta de um animal errante, que seria então, suplementada durante seu tratamento. A deficiência de cobalamina é uma anomalia frequente em gatos com sinais clínicos de doença do trato gastrointestinal (9). Como tratamento foi recomendado principalmente um manejo clinico paliativo para controle os sintomas e melhora da qualidade de vida do animal.

O paciente deve passar a se alimentar com uma dieta pastosa oferecida na altura dos olhos, para que a gravidade auxilie na descida do alimento até o estômago, não acumulando no esôfago e assim evitando a regurgitação. Além disso também foi prescrito um protetor gástrico (Omeprazol), antiemético (Ondansetrona), suplemento vitamínico (Glicopet felinos) e antibiótico (Amoxilina + Clavulanato de Potássio).

Foi solicitado um acompanhamento semanal para avaliar o paciente e acompanhar seu ganho de peso. Nas semanas seguintes após início do tratamento, o animal apresentou melhora no seu comportamento e houve diminuição dos vômitos após se alimentar, mas seu peso não se alterou muito desde a primeira consulta.

Foi realizada uma tentativa de retirada do protetor gástrico, mas sem sucesso.

O paciente ainda apresenta algumas recaídas devido a eventuais fugas, mas estável nos períodos em que se encontra na residência dos tutores, será mantido o Omeprazol de forma contínua junto dos manejos alimentares, além de acompanhamento com o veterinário para verificar sua evolução.

CONCLUSÃO

O diagnóstico da doença de megaesôfago em gatos adultos é raro, podendo ser sugestivo na anamnese e exame físico de pacientes que apresentam regurgitação ao se alimentar e perda de peso progressiva, além de ser confirmado pelo exame radiográfico contrastado da região do esôfago. O prognóstico da doença acaba sendo de reservado a mau, por não haver um tratamento efetivo, apenas paliativo. A colaboração do proprietário no estilo de vida de seu animal, referente ao manejo da alimentação, é de suma importância para a qualidade de vida do paciente afim de evitar o agravamento do quadro. A enfermidade se trata de uma experiência clínica dos autores e se faz necessário novos estudos científicos para aprofundamento do caso.

REFERÊNCIAS

1- RÊGO M. S. A.; Megaesôfago em gato atendido no Hospital Veterinário do DMV da UFRPE.Univerisdade Federal Rural de Pernambuco, p.1-2, 2009.

2- BRAZ, J.; vet. Res. Anim, Sei., São Paulo, v.40, p196-197, suplemento, 2003.

3- NELSON, R.W.; COUTO, C.G. Anomalias do anel vascular. cap. 9, p. 125, São Paulo: Manole, 1998

4- SOUZA, M. G.; ZILIO, B. S.; COSTA, J. L. O. Megaesôfago em cães – revisão de literatura. Revista Científica Eletrônica de Medicina Veterinária. Janeiro 2007.

5- FIGUEREIDO, A. S.; JÚNIOR, J. P. A. Vírus da leucemia felina: análise da classificação da infecção, das técnicas de diagnóstico e da eficácia da vacinação com emprego de técnicas sensíveis de detecção viral. Ciência Rural. Santa Maria. V.41, n.11, p.1952-1959, Nov. 2011.

6- GONÇALVES, R. J. Vírus da imunodecifiencia felina e vírus da leucemia felina. Centro Veterinário do Planalto Central Aparecido dos Santos, p.7, 2019

7- FROWDE, P.P.; BATTERSBY, I.A.; WHITLEY, N.T.; ELWOOD, C.M. Oesophageal disease in 33 cats. Journal of Feline Medicine and Surgery, v.13, p. 564-569, 2011.<DOI:10.1016/j.jfms.2011.04.004>

8- SOUZA, R. C. L,; Incidência de doenças esofágicas em cães e gatos atendidos no setor de radiologia do Hospital Veterinário da Universidade Estadual de Londrina nos anos de 2006 a 2016. Universidade Estadual de Londrina, p.27, 2018.

9- RUAUX, C. G. et. al. p.1 (2005) Early biochemical and clinical responses to cobalamin supplementation in cats with signs of gastrointestinal disease and severe hypocobalaminemia. J Vet Intern Med; 19(2): 155-160.

Priscila Barreto de Abreu

(11) 953534441
[email protected]
Graduação pela UNESP/FCAV; Iniciação científica com ênfase em oftalmologia veterinária “Flarimetria à laser em cães pós facoemulsificação, com e sem implantação de lente intra-ocular em cães”; Artigos publicados em anais de congressos e revistas científicas; Residência em Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais pela UnB; Participação em cursos de aperfeiçoamento e congressos; Médica-veterinária do Centro Veterinário Eiras Garcia.

Giovanna Funiscello de Sousa

(11) 988321771
Discente no curso de Medicina Veterinária na Universidade Santo Amaro (UNISA); Curso de anestesia, oftalmologia, neurologia e ortopedia; Iniciações cientificas: “Avaliação Histopatologica e Imunohistoquímica do Encéfalo de Ratos Wistar Alimentados com Dieta Hiperlípidica e Suplementados com Resveratrol” contemplada com bolsa PIBIC; “Avaliação Histopatologica e Imunohistoquímica do Encéfalo de Ratos Wistar Fumantes Passivos e Alimentados com Alimentos Funcionais”; “Jogo das cinco liberdades” e “Estudo multicêntrico para a vigilância de SARS-CoV-2 em animais de companhia com interface à Saúde Única (PetCOVID-19 Study): corte prospectiva de mamíferos domiciliados para avaliação de risco de transmissão zooantroponótica no Brasil”; Estagiária do Centro Veterinário Eiras Garcia.

Isabelly Berbat Utsonomia

(11)964953907
Discente no curso de Medicina Veterinária no Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU); Estágio em clínica médica e cirúrgica de pequenos animais; Curso de endocrinologia em pequenos animais; Curso de inglês avançado; Estagiária do Centro Veterinário Eiras Garcia.

Jennifer Novaes Soares

Discente no curso de Medicina Veterinária na Faculdade Metropolitanas Unidas (FMU); Estágios em clínica médica de pequenos animais, clínica cirúrgica, clínica de felinos, castração, laboratório, internação; Curso de auxiliar veterinário na instituição CTI EDUCAR; Estagiária na Clínica Veterinária ProBicho com enfoque em felinos.

Mariana Lourenço Veloni

(11) 959205942
[email protected]
Graduação pela UNESP/FCAV; Artigos publicados em revistas científicas; Residência em Clínica Cirúrgica de Animais de Companhia pela Universidade Federal de Uberlândia; Pós-graduação em Gestão de Consultórios e Clínicas Veterinárias; Coordenadora do Hospital Veterinário Savevet.

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