Dermatoses actínicas em cães – aspectos clínicos, diagnóstico e tratamento – Revisão de Literatura

Por Fabiana Patricia Perdomo Vitale

Dermatoses actínicas em cães – aspectos clínicos, diagnóstico e tratamento – Revisão de Literatura

A dermatite actínica ou ceratose actínica resulta da exposição prolongada de cães geneticamente predispostos a radiação solar ultravioleta (UVA e UVB), resultando em dano cutâneo. Podem ser classificadas em: dermatite solar nasal, dermatite solar do tronco e a dermatite das extremidades canina (NITTA, 2019).

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A radiação ultravioleta na pele, após sua absorção por cromóforos, resulta em inúmeras reações fotoquímicas, promovendo alterações moleculares a nível de DNA, comprometendo a transcrição e replicação celular, promovendo a apoptose celular, inflamação e carcinogênese, possibilitando então o posterior desenvolvimento de neoplasias cutâneas. Após as injúrias no DNA, as radiações promovem a síntese de citocinas inflamatórias e prostaglandinas, como a IL-10, TNF alfa, IL-1 e PG2, responsáveis pelos sinais clínicos comuns a esta enfermidade (ALBANESE et al., 2013; NITTA, 2019). A conversão de ácido araquidônico em prostaglandina é catalisada pela ciclo-oxigenases (COX) e estudos indicam que a COX-2 é bastante expressada em paciente com carcinoma espinocelular e queratose actínica (AN et al., 2002; POGGIANI et al., 2012).

As raças mais predispostas são: American Staffordshire Terrier, Bull Terrier, Pit Bull, Dogo Argentino, Dálmata, Whippet, Greyhound Italiano, Beagle e Basset Hound (GROSS et al., 2009; ALBANESE et al., 2013). Não há predileção sexual e animais de meia idade a idosos são mais acometidos, mas já foram descrito casos em animais jovens, com dois anos de idade (GROSS et al., 2009; ROCHA; MUNIZ, 2018). 

Cão, mestiço de Pit Bull, fêmea, 5 anos, com presença de hiperqueratose, eritema, comedos e alopecia em dorso. – Foto de arquivo pessoal da autora

As lesões se desenvolvem em áreas de pele despigmentada, com alopecia ou hipotricose, ocasionando sinais clínicos de eritema, dor, hipertermia cutânea e prurido (NUTTAL et al., 2010). A presença de descamação, bem como comedos e pele com aspecto enrugado, acompanhada de hiperqueratose (Figura 1) também podem estar presentes nos quadros clínicos (ALBANESE et al., 2013). A distribuição das lesões pode ser em áreas como abdome (Figura 2), região inguinal, face interna de membros pélvicos, axilas, plano e espelho nasal, tronco e extremidades de membros torácicos e pélvicos (GROSS et al., 2009; HARGIS, 2009; NITTA, 2019). A inflamação crônica leva a formação de fibrose e elastose cutânea, gerando aumento da espessura da pele em área clara (Figura 3), úlceras (Figura 4), piodermites, bolhas hemorrágicas e áreas de necrose (NITTA, 2019).

Cão, SRD, fêmea, 14 anos, região inguinal com presença de eritema, descamação, hiperqueratose e erosão. – Foto de arquivo pessoal da autora

O diagnóstico desta enfermidade é firmado através do exame histopatológico de amostras cutâneas colhidas por meio de biópsia. Os achados histopatológicos incluem dermatite perivascular superficial, com hiperqueratose paraqueratótica, hiperplasia epidérmica espongiosa e displasia cutânea, sem invasão da membrana basal (GROSS et al., 2009; NITTA,  2019). Os quadros em que há invasão da membrana basal, sugere-se a possibilidade de neoplasias como o carcinoma (GROSS et al., 2009).

Os diagnósticos diferenciais para quadros acompanhados de lesões ulcerativas e profundas são demodicidose, doenças autoimunes como pênfigo foliáceo, lúpus eritematoso cutâneo crônico e dermatomiosite, reações de hipersensibilidade como vasculites, farmacodermia e furunculose eosinofílica e quadros de neoplasias cutâneas como carcinoma espinocelular e fibrossarcomas. Para os quadros acompanhados de lesões descamativas, crostosas e ulcerativas, se faz necessário diferenciar para quadros de leishmaniose visceral canina, dermatofitose e escabiose (NUTTAL et al., 2010; ALBANESE et al., 2013; NITTA, 2019).

Para o tratamento recomenda-se a interrupção da exposição solar dos pacientes, no horário das 9 as 16 horas, onde o índice de radiação ultravioleta é maior. Nos casos em que a exposição não pode ser evitada, recomenda-se a utilização de protetores solares, a base de água para evitar intercorrências em caso de ingestão por lambedura, com fator FPS de 30 ou mais alta proteção (NITTA, 2019). Em casos brandos há a indicação de uso de corticóides tópico a base de hidrocortisona a 1%, a cada 24 horas. A administração de corticóides orais também pode ser feita, através do princípio ativo prednisolona, na dose de 1 mg/kg, a cada 24 horas, durante 10 dias (SCOTT et al., 2001). O uso de imunomoduladores a base imiquimod a 5%, administrado por via tópica, 3 vezes por semana, durante 3 semanas tem apresentando bons resultados, apesar de poucos resultados serem relatados em literatura (NITTA, 2019).

Cão, Pit Bull, macho, 5 anos, lesão dorsal com aumento de espessura da pele em área clara ao redor de área escura e presença de úlcera e crostas hemáticas (foto à esq.). À direita, lesão em região caudal de membro pélvico com ulceração, eritema e alopecia – Foto de arquivo pessoal da autora

A vitamina A, a base de 𝜷-caroteno, tem função de promover fotoproteção sistêmica, reduzindo a ação da queimadura solar. A dose recomendada é de 25 mg a cada 12 horas, uso de forma perene (ROCHA; MUNIZ, 2018; NITTA, 2019).

Em estudo desenvolvido por Albanese e colaboradores (2013), em 5 cães com dermatite actínica, tratados com o antiinflamatório firocoxibe, um inibidor seletivo COX-2, na dose de  5 mg/Kg, a cada 24 horas, durante 6 meses de tratamento, mostrou-se efetivo e sem efeitos colaterais. Acredita-se que este princípio ativo produza um efeito antiproliferativo, reduzindo desta forma a inflamação e carcinogênese (NITTA, 2019)’.

O prognóstico é bom a excelente em casos iniciais, mas quadros crônicos têm mau prognóstico, uma vez que a maioria destes casos evoluem para a carcinogênese, desenvolvendo neoplasias malignas da pele.

Referências bibliográficas:

ALBANESE, F.; ABRAMO, F.; CAPORALI, C.; VICHI, G.; MILLANTA, F. Clinical outcome and cyclo-oxygenase-2 expression in five dogs with solar dermatitis/actinic keratosis treated with firocoxib. Vet Dermatol. 2013; 24: 606–e147.

AN, K. P., ATHAR, M.; TANG, X. et al. Cyclooxygenase-2 expression in murine and human nonmelanoma skin cancers: implications for therapeutic approaches. Photochem Photobiol 2002; 76: 73–80.

GROSS, T. L. INRKE, P. J., WALKER, E. J., AFFOLTER, V. K. Doenças da pele do cão e do gato. 2ª Ed. São Paulo.  Rocca, 2009, p. 889.

HARGIS, A. M. Actinic keratosis and squamous cell carcinoma. J Small Anim Dermatol Pract 2009; 2: 12–24.

ROCHA, A. C.; MUNIZ, A. L. M. Ceratose actínica. In: Coletânea MedVep de dermatologia veterinária. Ed. MedVep. Cutitiba, 2018. 110-115.

NITTA, C. Y. Dermatopatias ambientais. In: Tratado de medicina externa – Dermatologia Veterinária. 2º Ed. Revisada e Ampliada. São Paulo. Interbook, 2019, p.801-807.

NUTALL T.; HARVEY, R. G.; MCKEEVER, P. K.; Enfermedades con formación de costras y descamación. In: Enfermedades cutáneas del perro y el gato. Zaragoza: Servet, 2010, p.180-181.

POGGIANI, S. D. S. C.; HATAYDE, M. R., LAUFER-AMORIM, R. et al. Expression of cyclooxygenase-2 and Ki67 in actinic keratosis and cutaneous squamous cell carcinoma in dogs. Open J Vet Med 2012; 2: 41– 47.

SCOTT, D. W.; MILLER W. H.; GRIFFIN, C. E. Muller e Kirk’s small animal dermatology. Philadelphia: Saunders, 2001, p. 1526.

M.V. Especialista - Fabiana Patricia Perdomo Vitale

Médica Veterinária formada pelo Centro Universitário - UNIFAJ, 2012. Especializada em Dermatologia Veterinária pela FMVZ-USP, 2015. Especializada em Ativação em Processos de Mudanças no Ensino em Saúde pela Fiocruz, 2020. Sócia da Sociedade Brasileira de Dermatologia Veterinária (SBDV) desde 2015. Atendimentos na especialidade de Dermatologia nos Hospitais Veterinários Taquaral e Estimma, em Campinas-SP.

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