Dermatofitose em cães e gatos

Por Gabriela Gomes Teixeira

Dermatofitose em cães e gatos

A dermatofitose é uma dermatite superficial muito comum na rotina dos atendimentos veterinários. Ela é formada por fungos hialinos, filamentosos, compostos por células chamadas hifas. Os dermatófitos apresentam biotropismo por estruturas queratinizadas, como unhas, pelos e estrato córneo da pele.

De natureza infecciosa e contagiosa, apesar de não ser uma doença grave ou levar o animal a óbito, apresenta  potencial zoonótico, já que os animais domésticos como cães e gatos tem se tornado parte da família convivendo diretamente com seus tutores e cada vez mais aumentando nosso contato entre as espécies, sendo  uma doença importante na medicina de pequenos animais, onde os gatos são os principais reservatórios.

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Os microrganismos isolados com maior frequência são Trichophyton mentagrophytes, Microsporum Gypseum e o mais comumente encontrado o Microsporum canis.  No entanto, esses dermatófitos não fazem parte do microbioma normal da pele ou seus anexos e se encontrado deve ser realizado o tratamento adequado indicado pelo médico veterinário.

A proporção em que são isolados cada agente causador pode variar de acordo com a região geográfica, inclusive dentro de um mesmo país. Sendo o Brasil, um país tropical, temos condições ideais para seu desenvolvimento, como a umidade e seu clima quente. Além disso avaliamos fatores como, a idade no animal onde jovens e idosos são mais susceptíveis, porém pode ocorrer em qualquer fase da vida. É importante observar as características fúngicas, ações terapêuticas, condições socioeconômicas da população, como ocorre em locais sem saneamento básico, onde favorece o aparecimento da doença e a dificuldade em seu controle, já que a higiene é fundamental para o sucesso no tratamento da dermatofitose.

O uso de medicamentos como os corticosteroides são muito importantes para auxiliar no combate de diversas patologias, mas podem levar a um imunocomprometimento, favorecendo o desenvolvimento da dermatofitose.

Animais errantes, geralmente com sua nutrição deficiente costumam apresentar imunidade baixa, sendo um grande fator de risco para infecção e disseminação da doença.  Locais com grande aglomeração e sem um manejo correto são mais difíceis de conseguir controlar o fungo pois sua disseminação ocorre de forma rápida e nem sempre visível pelo fato de alguns animais serem assintomáticos. A pelagem longa em algumas raças como os gatos Persa ou cães da raça Yorkshire por exemplo podem ser um grande fator de risco para a dermatite em questão.

As hifas colonizam os tecidos queratinizados e quando se fragmentam são chamados de artroconídeos, responsáveis pela  reprodução do fungo. Sua transmissão pode ocorrer através do contato direto com descamações e pelos infectados ou por contato indireto através de fômites contaminados como aparelhos de tosa, rasqueadeiras, toalhas, cobertores, camas, pentes entre outros, uma vez que os esporos podem permanecer por longos períodos no ambiente. Caso exista algum microtrauma no animal, será um fator importante para instalação da dermatofitose. A inoculação e desenvolvimento de lesões podem levar em torno de 14 dias.  Esses fungos atingem o bulbo piloso deixando os pelos ralos, mais fracos onde começamos a observar crostas, prurido variável de inexistente a intenso, áreas alopécicas circulares com bordas eritematosas que podem ser localizadas ou disseminadas por todo corpo.

Podem ocorrer, porém com menos frequência o pseudomicetoma (nódulos subcutâneos) geralmente na área da cauda e tronco que podem inclusive tornar-se ulcerados. Com essa alteração na pele a barreira cutânea torna-se prejudicada e podem ocorrer infecções secundárias.

Normalmente a queixa dos tutores é a perda de pelo no animal. Porém sendo uma doença zoonótica, por vezes podem se queixar de lesões entre os membros da família que tem contato com o cão ou o gato. O prurido pode variar, mas geralmente não é notado e é importante ressaltar que nem todo animal que tem contato com o fungo desenvolverá infecção.

Para o diagnóstico é preciso avaliar com cautela o histórico, realizar uma boa anamnese e exames complementares. A Lâmpada de Wood pode direcionar o melhor local para coleta de exames, sugerindo a presença do fungo, já que é feita durante a consulta, onde poderá fluorescer o pelo contaminado com o Microsporum canis servindo como método de triagem. O tricograma é um importante aliado para o diagnóstico, devendo ser coletado das bordas das lesões e examinado através do microscópio. A citologia pode encontrar a presença de artroconídios.  No entanto o método mais confiável é a cultura de fungos onde é colocado uma amostra em meio de cultura próprio.  Quanto antes for realizado o diagnóstico, menores as chances de infectar outros animais ou contaminar ambientes, diminuindo sua propagação inclusive para as pessoas que convivem com o animal. As lesões podem ser facilmente confundidas com outras dermatites. Por esse motivo um diagnóstico eficaz fará toda diferença no correto tratamento para o animal.

O uso de equipamento de proteção individual, como as luvas de procedimento são importantes para realização da consulta e coleta de exames para proteção do médico veterinário e seu uso é indispensável. Se o animal estiver soltando muito pelo durante o atendimento a troca do jaleco após a consulta será indicada.

Tratar o paciente com antifúngico adequado como por exemplo o itraconazol por período prolongado é um desafio principalmente quando se trata dos felinos pois a via de administração oral quase sempre é dificultosa e os tutores muitas vezes param o tratamento por conta própria. A associação com o tratamento tópico como o uso de xampu contendo clorexidine e miconazol, visando diminuir a reinfecção do hospedeiro com a diminuição de esporos e a descontaminação do ambiente com hipoclorito de sódio na diluição 1:10 evitando a propagação da doença para outros contactantes são fundamentais. Nos animais de pelos longos pode ser orientada a tosa para auxiliar no combate ao fungo. O uso da vacina pode ser indicado em alguns casos de Microsporum canis, principalmente quando o animal não tolera o indicado anteriormente por via oral.

De forma ideal o tratamento deve ser interrompido após duas culturas fúngicas negativas. Porém na rotina nem sempre o tutor pode realizar esses exames o que prejudica o acompanhamento da resposta à terapia.  Nesse caso prolongar o antifúngico até duas semanas após a cura clínica pode ser uma boa estratégia.

Caso o tratamento seja focado apenas no animal, com o uso do antifúngico sistêmico, o resultado não será satisfatório visto que os esporos podem permanecer por até 18 meses no ambiente.

Para alcançar sucesso na terapêutica deve ser realizado conjuntamente as formas tópica, sistêmica e com associação a descontaminação do ambiente para melhores resultados.  Não adianta entrar com o melhor medicamento se não for feita uma orientação excelente ao tutor sobre a importância e desafios do tratamento e estar à disposição em todos os momentos para esclarecer dúvidas e ajudar no que for preciso.

É importante ter em mente que esta doença pode apresentar cura espontânea em animais sadios, porém é preciso tratar todos os casos identificados, principalmente tratando-se de uma zoonose e pensando em acelerar a resolução da doença, limitar a disseminação a outros animais e pessoas diminuindo a contaminação do ambiente.

Vale lembrar que o contato com esses fungos não resulta necessariamente em infecção. Alguns animais acometidos podem ser assintomáticos e nunca desenvolver os sinais clínicos. O papel do médico veterinário é crucial, sempre atento aos pacientes com suspeita da doença e formas de combater a transmissão para pessoas e outros animais susceptíveis. Sempre solicitando exames nos casos suspeitos e orientando os tutores sobre a importância dessa zoonose.

Referências bibliográficas:

Minovich, FG. Manual Prático de medicina felina. 1 ed. MedVet.2021

Little Susan. O Gato. ed ROCA 2015

Rhodes, Karen.  Dermatologia em pequenos animais.2 ed ROCA 2011

Revista Brasileira de Educação e Saúde. Aspectos clínicos, diagnósticos e terapêuticos da dermatofitose em cães e gatos e sua importância como zoonose 2020.

Dra. Gabriela Gomes Teixeira

Graduada em Medicina Veterinária pela UNIP em 2016. Trabalha com atendimento domiciliar há 5 anos. Essência Animal - Atendimento veterinário domiciliar. WhatsApp: (19) 98119-5954

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